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sexta-feira, 16 de maio de 2014

Especial polícias: como Chile, Argentina e Brasil pensam a segurança pública

Repórteres nos três países revelam diferentes modelos de policiamento e elucidam o processo de desmilitarização

Enquanto os candidatos à Prefeitura de São Paulo discutem a viabilidade de aumentar o contingente e o poder da Guarda Civil Metropolitana, outros problemas relacionados às forças de segurança pública afligem a sociedade paulista. Os guardas civis metropolitanos dividem o patrulhamento das ruas com a Polícia Militar, responsável pelo trabalho ostensivo no Estado de São Paulo.

Essa instituição, que foi criada por decreto da Ditadura Militar em 1970, acumula desde aquela época denúncias de abusos contra a população. De 2005 até este mês, pelo menos 3206 pessoas foram mortas pela Polícia Militar, segundo dados da Secretaria de Segurança Publica do Estado de SP. Neste mesmo período, a ROTA, batalhão criado durante o regime militar, matou cerca de 500 pessoas.

Movimentos sociais e organizações de direitos humanos atribuem a alta letalidade e a violência das ações da polícia militar ao seu vínculo com o período ditatorial e propõem que a estrutura do órgão seja desmilitarizada. O Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas aderiu ao pedido no último mês de maio, quando recomendou ao governo brasileiro o combate dos grupos de extermínios presentes em suas forças de segurança pública (os chamados "esquadrões da morte") e a extinção da Polícia Militar.

O caso brasileiro não é único entre os países latino-americanos, marcados por regimes militares altamente repressivos na história recente e que ainda lutam pela consolidação dos direitos democráticos.

O Opera Mundi traz três matérias sobre diferentes modelos de policiamento e de segurança pública vigentes na América do Sul. De um lado, Aline Boueri e Luciana Taddeo revelam as experiências da população argentina ao lado de uma polícia totalmente desmilitarizada. De outro, Victor Farinelli revela a lógica de funcionamento dos Carabineros de Chile, instituição de cunho fortemente repressivo, que foi reativada durante a ditadura do general Augusto Pinochet. Por fim, Fillipe Mauro e Marina Mattar refletem acerca do caso brasileiro, dando voz a especialistas sobre a necessidade ou não de desmilitarizar a PM.


No Chile, a corporação militar do país, os Carabineiros, foi criada em 1927 pela ditadura do general Carlos Ibáñezdel Campo (1927-1931) e reativada durante o regime de Augusto Pinochet (1973-1990), adquirindo caráter ainda mais repressivo. Neste período, foi criado o batalhão de Forças Especiais, com a determinação de atuar no “controle de multidões e manifestações, visando à manutenção da ordem pública”, segundo um instrutivo interno da instituição.

Este grupo da polícia militar é responsável até hoje pela repressão de protestos e recebe a maior parte das denúncias contra violência policial no Chile. Somente nas marchas estudantis ocorridas entre junho de 2011 e o mesmo mês de 2012, foram registradas 3147 denuncias de abusos, torturas, nudez forçada e detenções injustificadas no INDH (Instituto Nacional de Direitos Humanos).

Segundo o historiador Sergio Grez Toso, da Universidade do Chile, nos governos da Concertação (aliança de centro-esquerda que governou o país após a ditadura, entre 1990 e 2010) não houve mudanças estruturais na polícia militar. Somente em 2007, durante o governo da socialista Michelle Bachelet, foi estabelecido um curso de direitos humanos para oficiais de alta patente, o que foi mantido pelo atual presidente, Sebastián Piñera.

Grande parte dos estudiosos e ativistas envolvidos com a questão da violência policial aponta que a desmilitarização pode ser a chave para solucionar este problema, entendido como uma herança maldita das ditaduras. Foi essa percepção que motivou os argentinos a desmilitarizarem suas polícias durante a redemocratização em 1992.


Desde 1992, a Gendarmería e a Prefectura Naval – oriundas do Exército e da Marinha respectivamente - passaram a ser controladas por civis. Para Marcela Perelman, coordenadora da equipe de Políticas de Segurança e Violência Institucional do Centro de Estudos Legais e Sociais, este foi um importante marco para a democracia argentina.

“Vale a pena recapitular que, na transição democrática da Argentina, quando se começou a discutir que lugar teriam as Forças Armadas e Policiais, um dos consensos foi a demarcação entre Segurança Interior e Defesa. A lei de Segurança Interior, de 1992, mostra que não deve haver atividade militar no interior do país, nem a identificação de inimigos internos”, explica Marcela.

A ruptura com o período da Ditadura Militar é questionada por Marcelo Saín, doutor em Ciências Sociais, deputado pela província de Buenos Aires e especialista em segurança pública. Ele afirma que, apesar do aparente caráter civil da Polícia Federal Argentina, que atua principalmente na Capital Federal, e da Polícia da Província de Buenos Aires (La Bonaerense, como é conhecida), ambas as forças são fortemente militarizadas em sua estrutura e atuação.

Para Georgina Arturi, da Coordenadoria Contra a Repressão Policial e Institucional (Correpi), o cotidiano dos moradores não foi alterado. “Todas são forças de segurança de um Estado que tem como política a repressão preventiva, voltada para os jovens de setores populares, e seletiva, voltada para militantes de organizações sociais”, afirma. “Desde 1983 até hoje, 66 pessoas foram assassinadas pelas forças de segurança durante protestos sociais. São mais de 3500 mortos pelo aparelho repressivo do Estado desde 1983. De que democracia estamos falando?”


Muitos brasileiros têm a certeza de que as práticas da polícia militar devem mudar para o órgão se adequar ao regime democrático e aos direitos do cidadão. Milhares de pessoas assinaram um abaixo-assinado nas redes sociais pelo fim da Polícia Militar de São Paulo e movimentos como as Mães de Maio e a Rede 2 de Outubro, que lutam pela desmilitarização e pela justiça popular, se fortalecem cada vez mais.

Consultado pela reportagem de Opera Mundi, André Vianna, especialista em segurança pública do CICV (Comitê Internacional da Cruz Vermelha) e coronel da reserva da Polícia Militar de São Paulo, acredita que a desmilitarização não vai resolver o problema.

É o que pensa Luciana Guimarães, diretora da ONG Sou da Paz. Para ela, não há sentido algum na desmilitarização das corporações já que esse processo não significa abolir seu trabalho ostensivo. “Mesmo com essa mudança, a formação e a agenda da polícia seria muito semelhante, pois não é mudando o nome que toda a corporação vai mudar” disse ela ao Opera Mundi.

Para Luciana, é necessário que as instituições de controle e o treinamento da polícia militar sejam aperfeiçoados. “Há necessidade de um processo de ajuste da doutrina (documentos que orientam a atuação), da educação (formação), do treinamento continuado (aos que estão já em atividade) e, sobretudo, no sistema de controle interno”, acrescenta André.

No entanto, alguns estudiosos não concordam com essa posição e afirmam que a polícia, militar ou civil, continuará agindo com truculência e de forma abusiva nas periferias das grandes cidades. “A polícia é um instrumento de governo da conflictividade da política democrática e isso explica porque a política democrática na Argentina não é simpática a uma reforma policial. Porque a polícia serve para disciplinar os setores populares, para controlar politicamente a oposição, para regular mercados ilegais e o crime organizado”, argumenta Saín.

Enquanto que o problema da violência policial e da alta letalidade das forças de segurança pública é claro e explícito em nossa sociedade, sua solução parece levantar muitas interrogações.

Fonte: Portal Opera Mundi/Uol

sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Pressão sobre policiais cresce, na Argentina e no continente

Por que não permitir que policiais tenham seus direitos trabalhistas reconhecidos?
 
Um rastro de protestos de policiais em 20 entre 23 províncias deixou governantes e cidadãos argentinos em alerta recentemente. Ainda não se dissipara a recordação de três outros aquartelamentos durante este ano e do conflito intenso protagonizado pela gendarmaria em 2012.

Essa recorrência traz à tona um dos paradoxos das democracias na América Latina. A escalada da insegurança fez aumentarem o peso e as dimensões das instituições policiais na região. Além disso, cresceu a pressão pública por mais eficiência e profissionalismo policial, com respeito absoluto pelos direitos humanos dos cidadãos.

Enquanto isso, continuam a ser negados direitos como o da sindicalização, sem que existam mecanismos que garantam condições de bem-estar e remuneração.

O Brasil acumula cerca de 160 protestos policiais nos últimos dez anos. Países como Honduras e Equador sofreram protestos policiais que derivaram em conspirações contra o Estado de Direito.

A situação contrasta nitidamente com a da América do Norte e da União Europeia, cujas polícias têm o direito de sindicalização sem greves e costumam manifestar-se publicamente. Em nossa região, apenas o Uruguai tem sindicato policial reconhecido.

A pergunta é: por que não permitir que policiais tenham seus direitos trabalhistas reconhecidos? Nós, que há muitos anos realizamos trabalho de campo etnográfico entre policiais, sabemos que o argumento contrário à concessão de tais direitos vem da negação da condição de trabalhador aos policiais, justificada por uma essência do "ser policial", que seria alheia à dignidade do "trabalho".

Essa visão costuma rejeitar a pergunta de como as lógicas sociais, políticas e jurídicas os atravessam e recusar a questão de como clivagens geracionais, de gênero e de classe são alguns dos princípios que regulam as tarefas que cabem à polícia.

Hoje, temos instituições policiais com alta proporção de jovens socializados numa era de expansão dos direitos dos cidadãos e protestos por sua ampliação. Por que eles deveriam evitar tomar a palavra ou resistir a certas microextorsões que, na ausência de canais paralelos de reivindicação, alimentam a cadeia de comando e o funcionamento crucial das polícias?

Acreditamos que o debate sobre sua condução democrática deva começar com a ampliação do olhar para essas outras realidades, cujo conhecimento é necessário para qualquer reforma viável.

Sabina Frederic é professora e pesquisadora da Universidade Nacional de Quilmes e do Conselho Nacional de Pesquisas Científicas e Técnicas da Argentina 
 
Fonte: Folha de São Paulo

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

Vídeo 'xenófobo' de militares causa escândalo no Chile

Um vídeo que mostra aparentes demonstrações de xenofobia de um grupo de militares chilenos vem causando polêmica no Chile, Peru, Bolívia e Argentina.

Na gravação, divulgada na internet por um transeunte que encontrou os militares em Viña del Mar, cerca de 40 homens aparecem correndo em uma praia e cantando "Argentinos matarei, bolivianos fuzilarei, peruanos degolarei" ( CliqueAssista aqui no YouTube).

A divulgação do vídeo gerou um escândalo no Chile, e o Exército emitiu um comunicado em que diz ter "tomado conhecimento do vídeo publicado e se disposto a iniciar a investigação correspondente, com o objetivo de determinar responsabilidades e aplicar as medidas disciplinares pertinentes".

A porta-voz do governo chileno, Cecilia Pérez, disse na quarta-feira que o episódio é "vergonhoso e não acompanha em nada o espírito de nossas Forças Armadas". O ministro de Defesa em exercício do Chile, Alfonso Vargas, prometeu punir os responsáveis e ordenou uma investigação dentro de 24 horas. Historicamente, as relações do Chile com seus vizinhos têm sido problemáticas.

O país lutou contra Bolívia e Peru no século 19 e ainda tem disputas de fronteiras com ambos. Nos anos 1970, o Chile quase foi à guerra contra a Argentina. 

'Beberemos o sangue deles'

O comandante da Marinha chilena, general Edmundo González, disse que o vídeo é ináceitável. Em seu perfil no Twitter, ele prometeu "sanção máxima" aos responsáveis pelo cântico, se for confirmado que eles pertencem às Forças Armadas.

Em resposta a um internauta que disse que "quem frequenta academias militares sabe que esses cânticos são entoados todos os dias durante a corrida", o General disse que a instrução era "entoar cânticos militares e não improvisações".

"Este é o pecado daquele vídeo", afirmou González.

Versos cantados por militares chilenos

No entanto, o comentarista no Twitter disse que o cântico não era uma improvisação e citou um verso que não aparece no vídeo: "e nós beberemos o sangue deles". O ministro da Defesa em exercício do Chile disse que o país já foi "vítima de situações semelhantes em outros países e nós não gostamos".

Vargas disse ainda que os versos não estão em consonância com a política do Chile em relação a seus vizinhos "irmãos". 

Repercussão

O vídeo foi destaque na imprensa de diversos países sul-americanos, especialmente nos envolvidos. O principal portal de notícias argentino, Clarin.com, disse que a gravação era "escandalosa", enquanto La Razón, da Bolívia, afirmou que um alto oficial pediu a "condenação internacional" dos responsáveis.

A divulgação da filmagem também gerou reações e críticas dentro da oposição e de ONGs. O deputado do Partido Comunista chileno, Hugo Gutiérrez, disse à mídia local que espera que a investigação em curso sirva "para que todos estes cânticos xenófobos de treinamento sejam eliminados das práticas cotidianas das Forças Armadas".

Gutiérrez indicou que este incidente pode gerar atritos desnecessários no processo atual entre o Chile e o Peru no Tribunal Internacional de Justiça em Haia por causa da fronteira marítima no Pacífico entre os países.

O Chile ainda tem questões de fronteira não resolvidas com a Argentina, envolvendo os limites do campo de gelo do sul da Patagônia. A Bolívia também disputa pacificamente o acesso ao oceano Pacífico desde que perdeu sua costa em uma guerra contra o Chile no século 19. 

Fonte: Portal Ig

sexta-feira, 16 de março de 2012

Justiça do Pará rejeita denúncia contra major Curió

Segundo decisão, Lei da Anistia deve ser aplicada e o crime está prescrito; Ministério Público do Pará informou que vai recorrer

A Justiça Federal do Pará rejeitou na tarde desta sexta-feira a denúncia do Ministério Público contra o coronel da reserva Sebastião Rodrigues de Moura, conhecido como major Curió, pelo crime de sequestro qualificado contra cinco militantes, capturados durante a repressão à Guerrilha do Araguaia, na década de 1970, cujo parardeiro não foi identificado até hoje. O MPF afirmou que vai recorrer da decisão.

Segundo o parecer do juiz João Cesar Otoni de Matos, da Vara Federal de Marabá, que criticou a iniciativa do MP, a Lei de Anistia deve ser aplicada e, mesmo que não houvesse essa opção, o crime está prescrito..

Nesta semana, procuradores decidiram entrar com a ação na Justiça Federal no Pará alegando que o caso não se encaixava na Lei de Anistia, que foi validada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2010.

Segundo a denúncia, Curió deveria ser responsabilizado pelo sequestro de cinco militantes políticos. Como estão desaparecidos até hoje, os procuradores consideram esse um crime permanente.

Ao negar a denúncia, o juiz João Cesar Otoni de Matos considerou que o MPF cometeu um equívoco ao entrar com a ação. “Depois de mais de três décadas, esquivar-se da Lei da Anistia para reabrir a discussão sobre crimes praticados no período da ditadura militar é equívoco que, além de desprovido de suporte legal, desconsidera as circunstâncias históricas que, num grande esforço de reconciliação nacional, levaram à sua edição”.

Sobre a possibilidade de prescrição do crime, o juiz afirma que a morte dos cinco opositores do regime militar deve ser presumida nesses casos, “diante do contexto em que se deram os fatos”.

O MPF no Pará anunciou na noite de sexta-feira que vai recorrer da decisão. Segundo nota, os procuradores da República que atuam no caso – do Pará, Rio Grande do Sul e São Paulo – já estão trabalhando no recurso que será dirigido ao Tribunal Regional Federal da 1ª Região.

“Estamos efetivamente dispostos a cumprir a determinação da Corte Interamericana de Direitos Humanos que deixou clara a obrigação brasileira de trazer a verdade sobres os fatos que ocorreram naquele momento, de dar uma satisfação às famílias que até hoje não sabem o que ocorreu com seus parentes e também a cumprir o precedente do Supremo Tribunal Federal sobre vítimas de desaparecimento forçado”, diz o procurador da República Ubiratan Cazetta, um dos responsáveis pelo caso, em referência à decisão da Corte da OEA sobre os crimes cometidos por agentes da ditadura na guerrilha do Araguaia

Ao comentar o caso nesta semana, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, preferiu não tomar partido em relação à iniciativa dos colegas, limitando-se a destacar que se trata de uma tese diferente. Ele também reafirmou seu ponto de vista em defesa da Lei de Anistia e disse que o assunto deveria chegar ao STF.

Nesta sexta, em comunicado, a Organização das Nações Unidas (ONU) apelou para que o Supremo Tribunal Federal (STF) aceitasse a denúncia do Ministério Público Federal (MPF) para abrir um processo contra Curió.

Para a ONU, a ação era um "primeiro passo crucial para lutar contra a impunidade que permeia o período do regime militar no Brasil".

Fonte: Agência Brasil/Portal Ig

segunda-feira, 5 de março de 2012

Policiais desarmados na Argentina

A ministra da Segurança da Argentina, Nilda Garré, colocou em prática pela primeira vez o novo protocolo que deverá ser aplicado pela Polícia Federal nos casos de contenção de manifestações sociais e políticas.

Como medida principal está a proibição do porte de arma de fogo pelos agentes durante esse tipo de operação. Não será permitida nem mesmo a utilização de munição não letal, como balas de borracha. “A ideia é desescalar os níveis de violência”, explicou a ministra. “Deve haver proporcionalidade no uso da força pública”, completou.

O novo protocolo será aplicado nos casos em que esteja envolvido o contato físico e, eventualmente, atos de violência derivados dos protestos sociais e políticos. A medida prevê o uso de água e de agentes irritantes químicos pra dispersar multidões. O novo protocolo foi colocado em prática durante um protesto no bairro de Lugano. De acordo com o Ministério da Segurança, os resultados foram positivos.

A adoção do novo sistema foi bem recebida pela Polícia Federal. Setores da oposição, no entanto, criticaram a medida alegando que os policiais ficam desprotegidos ao estar sem nenhum tipo de arma.

Fonte: Fórum Brasileiro de Segurança Pública

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Desnecessária a Justiça Militar

A estruturação do Poder Judiciário oferece situações bastante controversas.

A incompreensão inicia-se pela sua própria origem. A Constituição Federal assegura que todo Poder emana do povo, mas o Judiciário é constituído sem participação alguma do cidadão; não se entende a existência do Legislativo e Executivo na União, Estados e Municípios, como fixa a Constituição, seguida da inexistência do Poder Judiciário nos municípios, como não quer a Constituição; não se aceita a eleição da diretoria dos tribunais da forma antidemocrática, indireta e biônica; não se compreende a duplicidade da Justiça, federal e estadual, ambas com o mesmo objetivo; não pode continuar a Justiça Militar; atípica a inclusão da Justiça Trabalhista no âmbito federal; absurdo o quinto constitucional, ou seja, o chamamento de advogados e promotores para comporem a Justiça de segundo grau, sem se submeterem a concurso, nem passar pelas comarcas do interior por onde trilham todos os magistrados; a contratação de juízes que mal saíram das universidades, sem experiência alguma de vida e o simples descarte compulsório dos juízes com farta experiência de vida.

E por aí vai!

Analisaremos neste trabalho a Justiça Militar. Criada fundamentalmente pela especialidade nos julgamentos de crimes militares e ações civis contra atos disciplinares, a Justiça Militar foi integrada ao Judiciário somente com a Constituição de 1934 e não possui estrutura semelhante à Justiça Comum. As decisões de primeira instância, por exemplo, sobem diretamente para o Superior Tribunal Militar.

A Justiça Militar é uma excrescência do sistema, simplesmente porque não há causas para justificar o aparelho burocrático judiciário, altamente custoso para a União e para os Estados. A fraqueza dessa especializada, na área federal, é atestada pela sobrevivência do segundo grau em apenas doze dos vinte e sete estados brasileiros e, na área estadual, em apenas três. Com isto, não se aponta ausência de jurisdição para apreciação dos recursos nas unidades federadas pelos próprios Tribunais de Justiça.

Estapafúrdia e em dissonância com o sistema, pois os vários segmentos da sociedade (empresarial, tributário, consumidor, família, agrário, ambiente etc.) não comportam a criação de Justiça da Empresa, dos Tributos, do Consumidor, da Família, Agrária, do Ambiente e outras. Há especialidades, como deveria acontecer com as demandas dos militares.

Para selar a desnecessidade da Justiça Militar, busca-se explicação nos números. O índice de causas que dizem respeito somente à caserna gira em torno de apenas 5%, num contingente aproximado de 310 mil militares nas três armas. Além de número inexpressivo as demandas não oferecem complexidade alguma para solução.

Também aqui há divisão para encarecer e complicar o sistema. Tem-se a Justiça Militar Federal, competente para julgar os militares integrantes do Exército, da Marinha e da Aeronáutica, e a Justiça Militar Estadual especializada para julgar os membros da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiros.

O Superior Tribunal Militar é formado praticamente por estranhos à área jurídica: quinze juízes vitalícios, dos quais três dentre oficiais generais da Marinha, quatro oficiais generais do Exército, três oficiais generais da Aeronáutica, mais cinco civis, dos quais três advogados, e dois escolhidos entre os juízes auditores e membros do Ministério Público da Justiça Militar. Todos são de livre escolha pelo Presidente da República, com aprovação do Senado Federal. Cada ministro do STM julga em média um processo por mês, servindo de assessores, carros oficiais, remuneração e estrutura equivalente à dos ministros do STJ.

O argumento forte para manutenção da Justiça Militar Federal prende-se aos julgamentos dos militares em tempo de guerra, apesar de esta ocorrência ser excepcional no Brasil. Em toda a nossa história, participamos de duas guerras: a do Paraguai (1864/1870) e a II Guerra Mundial (1939/1945). A solução para os conflitos militares, nesta excepcional época, deve limitar-se à criação de Justiça Especial Temporária, como, aliás, aconteceu, quando se criou duas Juntas, sediadas uma na província de São Pedro do Rio Grande do Sul e outra em Mato Grosso; a primeira instância competia aos Conselhos de Guerra. Em 1939, a apuração dos crimes praticados pelos membros da Força Expedicionária Brasileira (FEB) era de competência do Conselho Supremo de Justiça Militar, instância superior, mais o Conselho de Justiça e as Auditorias.

Pela formação completamente diferente da Justiça Militar, a Emenda 45/2004, que criou o Conselho Nacional de Justiça, não incluiu membros desta Corte especial na composição do órgão externo, apesar de ter contemplado todos os órgãos do Judiciário. Entende-se com esta posição um primeiro passo para a extinção da Justiça Militar.

E mais: é a única Justiça que tem poderes para decretar a pena de morte, evidentemente em tempo de guerra.

Na área estadual, a Justiça Militar, sediada na capital do Estado, possui duas instâncias: Conselho de Justiça Militar, composta por quatro oficiais das Armas, denominados de juízes militares, e um juiz auditor, que é o juiz togado. Já a segunda instância da Justiça Militar Estadual está presente somente nos Estados de São Paulo, Rio Grande do Sul e Minas Gerais; os outros Estados, pela própria desimportância conferem ao Tribunal de Justiça ou Câmaras Especializadas os julgamentos dos poucos recursos que aparecem.

A Justiça Militar era competente para julgar crimes de homicídio praticados por policiais militares contra civis; a impunidade gerou mudanças, que culminaram por retirar de sua competência a apuração e julgamento de tais delitos, passando para a competência da Justiça Comum.

A Argentina já deflagrou o movimento para extinção dos tribunais especiais para julgamento de crimes praticados por militares. Desde o ano passado foi aprovada lei neste sentido, que também revogou o Código de Justiça Militar de 1951, erradicando a pena de morte e descriminalizando a homossexualidade nas Forças Armadas. Os delitos essencialmente militares passarão agora a ser apreciados pela Justiça Comum. A motivação para justificar a medida se prendeu ao fato de os militares julgarem a si mesmos e não se obedecer ao princípio do devido processo legal.

No Brasil, o Rio Grande do Sul inicia o movimento pela extinção do Tribunal de Justiça Militar. Apontam-se o pequeno número de processos (apenas mil nas duas instâncias), os altos gastos com esta especializada, a morosidade nos julgamentos (mesmo com a média de 10 processos por magistrado). Estes dados foram fornecidos pelo CNJ em recente inspeção promovida na Justiça Militar do Rio Grande do Sul. Minas Gerais trilha no mesmo caminho com a aprovação da PEC 37/07 que extingue o Tribunal de Justiça Militar do Estado.

Pelo Brasil, afora, a situação não difere muito do que se viu em Porto Alegre.

Assim, pode-se assegurar que a extinção da Justiça Militar em nada contribuirá para atropelar a Justiça Comum que, na verdade, está assoberbada com o volume de processos, mas não sentirá diferença com o recebimento de 1.000 ou 2.000, originados da Justiça Militar e que serão distribuídos entre os juízes, cabendo a cada um menos de 10 feitos.

Além disto, este segmento de justiça é eminentemente corporativista, pois na sua composição estão militares, nomeados pelo governador, na área estadual, pelo presidente, na área federal. Em regra, não se exige de nenhum deles conhecimento da ciência do direito.

Antônio Pessoa Cardoso
Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia

Fonte: Revista Jus Navigandi

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Para saber mais:

Presidente do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul quer fim da Justiça Militar - http://asprase.blogspot.com/2011/02/presidente-do-tribunal-de-justica-do.html

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