segunda-feira, 30 de julho de 2012

Autoestima é escudo para policial

Policiais com estresse pós-traumático e doenças mentais são afastados para prevenção ou tratamento

O sonho de M. V. A. S., 23 anos, era se tornar um policial militar. Depois de passar pelo concurso e todas as provas de admissão da PM-SP, o jovem chegou onde sempre quis: tornou-se soldado do 7º BPM-I (Batalhão de Policiamento do Interior) de Sorocaba. Mas em 23 de fevereiro deste ano, após um desentendimento com a namorada, ele deu fim à própria vida.

Para evitar que o militar entre na onda sistêmica das doenças mentais e tome uma das iniciativas mais trágicas da humanidade – o suicídio – a PM de Sorocaba desenvolve uma série de atividades, dentro de programas específicos, para “limpar” a mente desse funcionário público que lida com o perigo da morte no dia a dia.

O major Eduardo da Silva Almeida, chefe interino do CAS (Centro de Apoio Social) da Polícia Militar do Estado de São Paulo, afirma que a morte do rapaz foi ocasionada por motivo passional. É o que informa o boletim de ocorrência.

Mas como um policial pode evitar que um transtorno mental interfira no  trabalho que pode influenciar na defesa da população e sua segurança? “A maioria dos policiais militares são resilientes, conseguem ter resistência a pressões. Para um pequeno contingente, que tem o estresse aumentado, é oferecida assistência psicológica imediata”, diz o major. “O praça e o oficial recebem preparação psicológica no trabalho.”

Para identificar atitudes suspeitas, a PM desenvolve o Prosen (Programa de Prevenção às Manifestações Suicidas). O potencial suicida tem olhar contemplativo, tristeza, discurso incoerente ou negativo, mau humor incompatível com seu perfil, comportamento auto-destrutivo indireto, com “intenção consciente de morrer” (negligência com a saúde), faz auto-mutilação ou conduz a viatura de maneira imprudente, entre outras manifestações.
 
A identificação das manifestações suicidas evoluiu desde 1991. Neste ano, a PM tinha apenas um psicólogo e estagiários. Hoje têm um corpo de mais de 60 profissionais, distribuídos pelos batalhões do Estado. Em Sorocaba, policiais que percebem algum sintoma no companheiro tem o dever de comunicar o CAS local. “Lidar com as próprias emoções era um tabu social que foi se modificando a partir da década de 1980”, diz o major Eduardo. “Hoje, o homem vive seus sentimentos com mais liberdade, menos preconceito e culpa. O bom policial procura ajuda, sem medo de ser feliz. Os companheiros apoiam.”

Os policiais com transtornos ou estresse pós-traumático ficam entre 17 e 28 dias afastados para prevenção ou tratamento de estresse pós-traumático e doenças. Todos aqueles que entram em situações de conflito (tiroteio, perseguições) entram pelo PAAPM (Programa de Acompanhamento e Apoio ao Policial Militar).

Aqueles que apresentam algum traço de manifestação suicida entram no PPMS (Programa de Prevenção de Manifestações Suicidas). “Para defender a vida da população, precisamos cuidar da nossa, antes. É um profundo processo de auto-conhecimento”, conclui o major da Polícia Militar.

Opinião do especialista Sabrina Maciel, psicóloga

Eles também sentem

Os policiais têm sentimentos e emoções que podem auxiliar e também prejudicá-los. Muitas vezes, manifesta comportamentos que são sinais de que algo não vai bem. Acúmulo de jornadas, excesso de responsabilidade e pouco reconhecimento da profissão são exemplos clássicos de mudança no comportamento. Algumas alterações, entre outras, são: isolamento social, baixa auto-estima, sensação de incapacidade, excesso de poder, super valorização da função, necessidade de atos heroicos, negação de qualquer possibilidade de recorrer a auxilio de psicólogos e médicos.

Para o policial, seguir tais comportamentos passa por um linear sutil – o status que a profissão de policial proporciona à grande maioria dos que ocupam o cargo justifica as atitudes, pois ele assume o papel de super-herói moderno, que com a arma de fogo pode acabar com todo o mal. A sociedade admira essa imagem. A necessidade de acompanhamento psicológico para esses profissionais deve ser periódico para que seja preventivo, mas é visto como meio punitivo.

Os policiais entendem que ser encaminhado para um técnico significa punição sobre a ação que cometeu. Quando a desmistificação da figura do policial militar for apresentada à sociedade, ele poderá reverter a imagem de salvador infalível. O problema está na formação. Os pais ameaçam os filhos quando fazem algo errado, dizendo: “Vou chamar a polícia”.

Tropa passa por terapia e aprende a fazer prevenção

Policiais entrevistados pelo BOM DIA (alguns pediram anonimato), falaram como fazem para prevenir doenças, traumas e manifestações suicidas. Um oficial, que pediu para não ser identificado, afirmou que um caso famoso no 7° Batalhão de Policiamento do Interior envolveu um cabo, que esteve à beira da morte após uma facada no pescoço. “Ele não esperava pela reação do suspeito, que desferiu um golpe fatal. Por milagre, ele não morreu”, lembra o colega. “Somos uma categoria mal paga e que corre risco de morte diariamente. Em ocorrências mais graves, com tiroteios, perseguições, defesa da vida e prisões complicadas, o comando afasta os envolvidos para tratá-lo. É normal.”

O cabo  em questão foi afastado das funções para tratamento médico do ferimento e apoio psicológico. Hoje, trabalha no batalhão normalmente, “Hoje eles têm um esclarecimento melhor sobre o tema.

A vergonha de se expor, de antigamente, ainda existe, mas é com uma minoria”, diz uma funcionária do setor do CAS (Centro de Apoio Social) da PM de Sorocaba. “O policial sabe que não pode ter essa postura tímida. É orientado, desde a formação na academia, a revelar angústias e sintomas. Entende que estamos aqui para orientá-lo e apoiá-lo. A defesa da vida e segurança da população depende do desempenho da tropa, que está ligada à saúde mental.”

O soldado Roberto Alves de Lima, 39 anos, afirma que foi afastado por duas semanas após um acidente de carro. “Eu bati a minha viatura durante um deslocamento. Não foi tão grave, mas o setor de saúde me colocou no PAAPM [Programa de Acompanhamento e Apoio ao Policial Militar]. Foi muito bom para mim. Fiz ioga, assisti filmes, tive aulas de artes marciais e palestras sobre saúde”, conta. O policial afirma que superou o trauma.

Após prendeu um suspeito de assaltar um transeunte, no dia da entrevista ao BOM DIA. “Pratico esportes e treino muito. O vigor físico e mental é fundamental.”

PM atende soldado por grupo temático

A “rede interna de informações”, o chamado rádio-peão da fábrica, identifica os soldados que precisam de apoio, pessoal e profissional e depois eles são encaminhados a áreas específicas. O “Grupo de Conflito Conjugal” trata de policiais com problemas em casa ou com parceiras. O munícipe pode contribuir com a corporação, pelo Disque-Denúncia (181). 102 policiais militares da região de Sorocaba foram afastados para prevenir o TEPT (Transtorno de Estresse Pós-Traumático) ou após manifestações suicidas.

Fonte: Blog da Renata/Amigos da Caserna

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