No dia de hoje publicamos pontos de vista diversos sobre a prisão administrativa militar. O primeiro deles é de autoria do eminente Sargento PMSE Antonio Carlos, jornalista:
Já o segundo artigo é de autoria do jurista militar Jorge César de Assis:
O fim da prisão administrativa militar:
Tramita na Câmara a Proposta de Emenda à Constituição (PEC) 357/09, do deputado Capitão Assumção (PSB-ES), que proíbe a prisão de bombeiros e policiais militares por infrações administrativas. Conforme a PEC, os integrantes dessas categorias só poderão ser presos em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de juiz, altera a redação do inciso LXI do art. 5º da Constituição Federal.É certo e incontroverso que as normas que regem as condutas dos militares são arcaicas e que muitas delas não foram recepcionadas com promulgação da Constituição de 05 de outubro de 1988, mas vem tendo eficácia por meio da força e do desconhecimento dos cidadãos, principalmente dos próprios militares, já que dos inúmeros abusos decorridos das transgressões, apenas uma pequena minoria dos lesados se submete a recorrer ao judiciário por medo de futuras perseguições. Alguns governos, como o do Rio Grande do Sul e o de Minas Gerais, acabaram com a possibilidade de o policial ser preso por infração administrativa, como chegar atrasado ou estar com a farda amassada.
A Constituição já exige o flagrante delito ou ordem judicial para a prisão de qualquer pessoa, mas abre exceção para transgressão militar ou crime militar definidos em lei. Segundo a PEC, essa exceção valerá apenas para os militares das Forças Armadas, diferenciando os militares da União dos estaduais. Precisa-se urgentemente da criação de um Código de Ética dos Policiais Militares de Sergipe, que entre outras normas e regras de conduta, estabeleça o fim da perniciosa prática da prisão disciplinar entre os policiais e bombeiros militares. É obvio que o militar que é preso arbitrariamente ou por motivos banais ficará insatisfeito, quando não revoltado, diminuído sua motivação na execução do seu trabalho.
Hierarquia e disciplina são as ditas colunas basilares ao funcionamento da engrenagem militar, sendo que a hierarquia militar é, ou deveria ser, a ordenação da autoridade e a disciplina regida pela rigorosa observância e acatamento integral das leis, regulamentos, normas e disposições, traduzindo-se pelo perfeito cumprimento do dever por parte de todos e de cada um dos componentes do organismo. Belo discurso se não fosse absolutamente visível aos olhos que isso não se concretiza, ou seja, mera conversa para inglês ver. O que se vê nos quartéis, infelizmente, é a completa perversão do Estado Democrático de Direito, aquém da legalidade precípua, inerente aos auspícios do nosso tempo histórico.
Desta maneira está se tornando realidade o fim das prisões por transgressão disciplinar militar que, certamente, satisfarão os princípios da legalidade, devido ao processo legal, inviolabilidade do direito de ir e vir e, principalmente, o princípio da dignidade da pessoa humana os quais se basilam o atual Estado Democrático de Direito, mas que estão sendo constantemente afrontados pelos entes militares através de condutas arbitrárias dos agentes que operam as transgressões militares. Não se pode esquecer que, apesar do lobe pró-arbítrio, as forças armadas não encerram em si a possibilidade legal desta ou daquela posição em relação ao xilindró como disciplina. O Comandante em Chefe das forças supracitadas é o Presidente da República e apenas o legislativo tem o condão de perpetrar ou acabar com esta ignomínia. Vamos pressioná-los para por um ponto final nesta barbárie.
É absurdo querer maquiar a Constituição Federal usando o inciso LXI do art. 5º da mesma, que irrefletidamente estabelece uma exceção as suas clausulas pétreas, contidas nos seus Princípios Fundamentais que devem ordenar todas as demais passagens da Carta Magna, o que evidentemente é contrariado por tal inciso. Por tanto deve-se extirpar ou modificar o inciso LXI do art. 5º sob pena de ilegitimidade constitucional, suprimindo a possibilidade de alguém ter a liberdade ameaçada pela prisão disciplinar, que nada mais é do que um engodo vexatório, abominável e ultrapassado.
Com tantos desafios pelos quais nosso país vem passando, na segurança pública, no Rio de Janeiro, São Paulo, e em tantos outros locais deste Brasil, estamos prestes a sediar uma copa do mundo de futebol e uma olimpíada, se faz necessário uma modernizaçao, profissionalização e otimização dos serviços prestados pelos órgãos militares, começando na valorização dos homens que detêm a dura sina de manter a ordem pública, não apenas com aumento salário, mas, primordialmente, com melhoria da qualidade vida e dos meios de execução do serviço.
É inadmissível tratar esses homens e mulheres à margem dos demais cidadãos, roubando-lhes os direitos e as liberdades, sob desculpas de se tratar de "militar" regido pela hierarquia e disciplina, pois estas não significam supressão da dignidade da pessoa humana que é o fundamento da nossa Constituição Cidadã e se deve defender a qualquer custo.
Como pode alguém que é garantidor dos direitos dos cidadãos, ter os seus direitos negados? E como bem disse Chaplin," o tempo é o melhor autor. Sempre encontra um final perfeito". Sejamos tempo então, em busca do final perfeito, o fim da prisão administrativa.
Já o segundo artigo é de autoria do jurista militar Jorge César de Assis:
O Código de Ética e Disciplina dos Militares do Estado de Minas Gerais – CEDMU - foi promulgado pela Lei nº. 14.310, de 19.06.2002.Fonte: Blog do Capitão Mano
Além da mudança de nome (Código de Ética e Disciplina ao invés de Regulamento Disciplinar) o referido diploma legal trouxe várias e profundas inovações nas relações entre superiores hierárquicos e subordinados, dentre as quais destacamos – por entendê-las de maior efeito no binômio disciplina e hierarquia, as seguintes: a exclusão do dever de obediência como sendo uma das manifestações essenciais da disciplina; a extinção da prisão disciplinar; o efeito suspensivo em todos os recursos disciplinares em detrimento da eficácia da punição disciplinar e; a participação de praças na apuração e julgamento das transgressões disciplinares.
A quase totalidade dos regulamentos disciplinares brasileiros prevê, como sendo uma das manifestações da disciplina, a obediência pronta às ordens dos superiores hierárquicos (art. 8º, § 1º, inciso II, do Regulamento Disciplinar do Exército).
É conditio sine qua non para a existência das instituições militares a circunstância elementar do militar dever consideração, respeito e acatamento aos seus superiores hierárquicos (art. 3º, Regulamento Disciplinar da Aeronáutica).
Salvo engano, o único Estado brasileiro que revogou como manifestação da disciplina a obediência pronta às ordens dos superiores hierárquicos – e de conseqüência o dever de consideração, respeito e acatamento aos superiores hierárquicos, foi Minas Gerais, com a edição de seu inusitado Código de Ética e Disciplina, que não a previu em seu art. 6º, o que nos parece lamentável.
No extinto Regulamento Disciplinar o dever de obediência era tratado no Capítulo II (Princípios Gerais da Hierarquia e Disciplina, art. 5º, § 2º, I e II). No Código de Ética o dever de obediência foi omitido, descaracterizando a essência da natureza militar da Polícia Militar e do Corpo de Bombeiro Militar do Estado de Minas Gerais.
Se a obediência pronta às ordens dos superiores hierárquicos é uma das manifestações elementares da disciplina – daí decorre o dever de obediência comum às instituições militares, a falta de sua previsão nas leis e regulamentos militares (por omissão ou má-fé) torna a corporação capenga em um de seus sustentáculos e ai, conquanto a justificativa inicial apresentada fosse à valorização profissional dos militares do Estado, resguardando os princípios basilares da hierarquia e da disciplina, a constatação final é de referidos princípios basilares e constitucionais restaram sensivelmente enfraquecidos, podendo mesmo se falar em inconstitucionalidade por omissão, autorizando a competente ação no Supremo Tribunal Federal, nos termos do art. 103, § 2º, da Carta Magna.
Sabe-se que a idéia do CEDMU surgiu em 1999, através de propostas de parlamentares oriundos de diversos postos e graduações da Polícia Militar. Inovar não significa necessariamente progredir, principalmente em um sistema tão normatizado quanto o regime militar.
Há que se tomar cuidado com as propostas de cunho eleitoreiro mesmo porque, os que as fazem, não têm mais responsabilidade pela manutenção da disciplina e eficiência da Força, nem estão subordinados ao regulamento disciplinar que pretendem transformar, apenas querem ser eleitos – ou reeleitos, mantendo seu status pessoal de detentor de mando político.
As polícias militares e corpos de bombeiros militares, na condição de forças auxiliares e reserva do Exército Brasileiro, guardam similitude com a Força Terrestre em termos de punições disciplinares, com algumas variações peculiares, como p.ex., a Brigada Militar do Rio Grande do Sul, prevê, no art. 13 de seu Regulamento Disciplinar ao tratar da prisão que, “exclusivamente para atendimento das disposições de conversão de infração penal em disciplinar, previstas na lei penal militar, haverá o instituto da prisão administrativa que consiste na permanência do punido no âmbito do aquartelamento, com prejuízo do serviço e da instrução. Por ai se vê que o RDBM restringiu o conceito de prisão administrativa, que passa a ser aplicado somente nas hipóteses em que o Conselho de Justiça Permanente ou o Juiz de Direito do Juízo Militar desclassificar o crime militar para transgressão disciplinar, nas hipóteses em que o Código Penal Militar assim permite.
Por sua vez, o Regulamento Disciplinar (Código de Ética e Disciplina) da Polícia Militar de Minas Gerais aboliu a prisão administrativa, já que previu em seu estatuto apenas o seguinte: advertência; repreensão; prestação de serviços preferencialmente operacional correspondente a um turno de serviço semanal, que não exceda a oito horas; suspensão, de até dez dias; reforma disciplinar compulsória; demissão; perda do posto, patente ou graduação do militar da reserva (art.23).
Para Paulo Tadeu Rodrigues ROSA, “a prisão administrativa não deve ser um instrumento de coação, mas uma medida excepcional, devendo ser assegurado ao infrator todas as garantias processuais para que o cerceamento da liberdade, jus libertatis, possa ser revisto pelo Poder Judiciário, que é o guardião dos direitos e garantias do cidadão”.
E aduziu que os legisladores do Estado de Minas Gerais, preocupados com esta questão resolveram rever a existência da prisão administrativa nos regulamentos da PM, e decidiram pela sua extinção. A busca de valorização do profissional é o caminho que deve ser seguido para a melhoria do serviço prestado à população, e a extinção da prisão administrativa é o primeiro passo nesta caminhada.
E anotou, ainda que a Assembléia Legislativa mineira se mostrou sensível às pressões da Associação de Praças e Bombeiros do Estado de Minas Gerais – ASPRA, para a extinção da pena disciplinar de prisão. Cabe registrar que a PM de Minas Gerais é a única no Brasil que extinguiu a modalidade de prisão disciplinar.
De nossa parte, em que pese a existência de algumas vozes contra a prisão disciplinar militar não a vemos como antidemocrática. Pela própria natureza do serviço militar (e policial militar igualmente), onde aquele que detém o uso da força deve ser controlado de maneira rápida e eficaz, em benefício de uma melhor prestação de serviço em prol da coletividade, a consideramos necessária. Cremos que só o tempo dirá se a PM mineira andou na rota certa ao abolir a prisão disciplinar militar – temos nossas dúvidas.
Basta lembrar que a Constituição Federal reconhece e aceita a prisão disciplinar militar, e ai estáfortalecendo a disciplina e a hierarquia. Isso não acontece somente no Brasil, mas em outros países democráticos também, a exemplo de Portugal, onde a Constituição Portuguesa ao tratar do Direito à Liberdade e à Segurança, excepcionou do referido princípio a privação de liberdade, pelo tempo e nas condições que a lei determina, dentre outros casos, a prisão disciplinar imposta a militar, garantindo, no entanto, o recurso ao tribunal competente.
A própria Convenção Americana de Direitos Humanos de 1969, Pacto de San Jose da Costa Rica admite a prisão disciplinar militar, já que conforme o item nº. 2 de seu art. 7º, ninguém pode ser privado de sua liberdade física, salvo pelas causas e nas condições previamente fixadas pelas Constituições políticas dos Estados - partes ou pelas leis de acordo com elas promulgadas. (destaquei). Ora, se a prisão disciplinar militar brasileira está devidamente prevista tanto na Constituição Federal como nos regulamentos disciplinares, e aceita inclusive pelas convenções internacionais, ela é mais do que válida – e necessária como um dos instrumentos inclusive de preservação da disciplina e hierarquia.
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