Com uma vigorosa liminar, o ministro Celso de Mello, decano do Supremo Tribunal Federal, fez nesta terça-feira (16/11/2010) a Justiça Militar baixar a guarda em relação a uma anomalia: o julgamento de civis pela Justiça Militar em tempos de paz.
O ministro chamou às falas o Congresso Nacional, que ainda não atualizou o ordenamento jurídico e mantém o Código Penal Militar como instrumento de regulamentação do artigo 124 da Constituição Federal, na qual não se prevê, mas tampouco se veda, o julgamento de civis em crimes militares pela Justiça Militar.
A liminar afasta a competência militar no julgamento de dois civis que falsificaram documento de registro que deveria ser emitido pela capitania dos portos — ou seja, pela Marinha. Celso de Mello lembra, ainda, necessidade do julgamento por juiz natural, como postula a Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso LIII. “É irrecusável, em nosso sistema de direito constitucional positivo — considerado o princípio do juiz natural — que ninguém poderá ser privado de sua liberdade senão mediante julgamento pela autoridade judiciária competente. Nenhuma pessoa, em conseqüência, poderá ser subtraída ao seu juiz natural”.
Para Celso de Mello, a submissão dos réus à Justiça Militar possui um caráter “anômalo”. “A tentativa de o Poder Público pretender sujeitar, arbitrariamente, a Tribunais castrenses, em tempo de paz, réus civis, fazendo instaurar, contra eles, perante órgãos da Justiça Militar da União, fora das estritas hipóteses legais, procedimentos de persecução penal, por suposta prática de crime militar, representa clara violação ao princípio constitucional do juiz natural”, disse o ministro.
Em 14 densas páginas de fundamentação, o ministro historia a evolução das legislações nacionais em que se reservou a intervenção da Justiça Militar sobre a esfera civil apenas em tempos de guerra, como se deu na Argentina, Uruguai, Paraguai, México, Colômbia e outros países que delegam à Justiça Federal a incumbência.
Segundo o ministro, “não se tem por configurada a competência penal da Justiça Militar da União, em tempo de paz, tratando-se de réus civis, se a ação delituosa, a eles atribuída, não afetar, ainda que potencialmente, a integridade, a dignidade, o funcionamento e a respeitabilidade das instituições militares, que constituem, em essência, nos delitos castrenses, os bens jurídicos penalmente tutelados”.
A alentada liminar traz também o caso de Portugal, onde em 1997 a Justiça Militar foi extinta em tempos de paz. Em 2005, uma sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos determinou que a Justiça chilena adequasse sua legislação interna aos padrões internacionais por meio da adoção de medidas que impedissem que um civil pudesse vir a ser submetido à jurisdição dos tribunais penais militares.
O STF, ao longo do tempo, tem restringido o papel da Justiça Militar e o ministro Celso de Mello vem trabalhando na sua tese evolutiva há anos. Essa, porém, é a primeira vez em que é colocada, claramente, em evidência todos os aspectos da questão, que chega ao impasse da abertura constitucional e do artigo 9º do CPM.
HC: 106.171
Marília Scriboni
Leia aqui a liminar
Fonte: Site Jurídico Conjur
O ministro chamou às falas o Congresso Nacional, que ainda não atualizou o ordenamento jurídico e mantém o Código Penal Militar como instrumento de regulamentação do artigo 124 da Constituição Federal, na qual não se prevê, mas tampouco se veda, o julgamento de civis em crimes militares pela Justiça Militar.
A liminar afasta a competência militar no julgamento de dois civis que falsificaram documento de registro que deveria ser emitido pela capitania dos portos — ou seja, pela Marinha. Celso de Mello lembra, ainda, necessidade do julgamento por juiz natural, como postula a Constituição Federal em seu artigo 5º, inciso LIII. “É irrecusável, em nosso sistema de direito constitucional positivo — considerado o princípio do juiz natural — que ninguém poderá ser privado de sua liberdade senão mediante julgamento pela autoridade judiciária competente. Nenhuma pessoa, em conseqüência, poderá ser subtraída ao seu juiz natural”.
Para Celso de Mello, a submissão dos réus à Justiça Militar possui um caráter “anômalo”. “A tentativa de o Poder Público pretender sujeitar, arbitrariamente, a Tribunais castrenses, em tempo de paz, réus civis, fazendo instaurar, contra eles, perante órgãos da Justiça Militar da União, fora das estritas hipóteses legais, procedimentos de persecução penal, por suposta prática de crime militar, representa clara violação ao princípio constitucional do juiz natural”, disse o ministro.
Em 14 densas páginas de fundamentação, o ministro historia a evolução das legislações nacionais em que se reservou a intervenção da Justiça Militar sobre a esfera civil apenas em tempos de guerra, como se deu na Argentina, Uruguai, Paraguai, México, Colômbia e outros países que delegam à Justiça Federal a incumbência.
Segundo o ministro, “não se tem por configurada a competência penal da Justiça Militar da União, em tempo de paz, tratando-se de réus civis, se a ação delituosa, a eles atribuída, não afetar, ainda que potencialmente, a integridade, a dignidade, o funcionamento e a respeitabilidade das instituições militares, que constituem, em essência, nos delitos castrenses, os bens jurídicos penalmente tutelados”.
A alentada liminar traz também o caso de Portugal, onde em 1997 a Justiça Militar foi extinta em tempos de paz. Em 2005, uma sentença da Corte Interamericana de Direitos Humanos determinou que a Justiça chilena adequasse sua legislação interna aos padrões internacionais por meio da adoção de medidas que impedissem que um civil pudesse vir a ser submetido à jurisdição dos tribunais penais militares.
O STF, ao longo do tempo, tem restringido o papel da Justiça Militar e o ministro Celso de Mello vem trabalhando na sua tese evolutiva há anos. Essa, porém, é a primeira vez em que é colocada, claramente, em evidência todos os aspectos da questão, que chega ao impasse da abertura constitucional e do artigo 9º do CPM.
HC: 106.171
Marília Scriboni
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Fonte: Site Jurídico Conjur
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