Seminário na Faculdade de Saúde Pública da USP reuniu o ex-secretário nacional de Justiça Pedro Abramovay, o pesquisador Maurides de Melo Ribeiro e o jornalista José Arbex Jr. Houve críticas à política de encarceramento de usuários, apontou-se a violação de direitos básicos dos cidadãos e discutiu-se até como o tráfico alimenta os lucros da indústria de armas e do sistema financeiro.
São Paulo – Qual a relação entre o sistema
econômico e o tráfico de drogas? Que alternativas existem à falida e
violenta política antidrogas atual?
Essas foram algumas das
questões debatidas no seminário "A cracolândia muito além do crack", que
aconteceu na Faculdade de Saúde Pública da Universidade de São Paulo
(USP) e terminou nesta quinta-feira (31).
Ao longo de três dias,
profissionais de saúde, sociólogos, jornalistas, economistas e
integrantes de movimentos sociais estiveram reunidos para um debate
amplo sobre as dimensões históricas, políticas e econômicas das drogas.
Para
o ex-secretário nacional de Justiça Pedro Abramovay, que participou de
uma das mesas, desde que a política de "guerra às drogas" foi implantada
na década de 70, houve um aumento gritante na população carcerária, dos
índices de violência, no número de mortes por overdose e de usuários.
A
situação piorou ainda mais, disse ele, a partir de 2006, com o Sistema
Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas (Sisnad), que reforçou a
política de encarceramento do usuário. O resultado é uma explosão
carcerária para envolvidos com as drogas: em 2006 eram 60 mil presos por
tráfico, número que saltou para 125 mil em 2011.
“É preciso
furar o manto ideológico que impede a discussão dos erros e acertos, e
mostrar os efeitos perversos da guerra às drogas na vida real das
pessoas, na democracia e na sociedade em geral", declarou Abramovay.
Na
mesma linha, o pesquisador da Faculdade de Direito da USP Maurides de
Melo Ribeiro criticou exageros das leis penais e lembrou que a política
antidrogas restringe direitos dos cidadãos.
"O grande risco
dessas políticas de controle total que temos no mundo é o de tornarmos
nossas sociedades cada vez mais autoritárias, ditatoriais, embora
batamos no peito dizendo que é uma democracia", explicou Ribeiro, que
faz doutorado em direito penal e criminologia.
Mas se os sinais de fracasso dessa política são evidentes, por que é tão difícil transformá-la?
Uma
das hipóteses foi levantada pelo jornalista José Arbex Jr., um
estudioso do tema. Ele afirmou que o tráfico de drogas gera fluxos
milionários de recursos que são absorvidos por setores econômicos
poderosos, do sistema financeiro à indústria de armas.
"O
comércio de drogas é uma peça fundamental para garantir o fluxo que
alimenta o capitalismo", disse Arbex, professor de jornalismo da PUC-SP.
Para
que esse debate atinja toda a sociedade, "é preciso que haja gestores
públicos dispostos a enfrentar o problema, e quebrar este silêncio
imposto", apontou Abramovay. Para ele, a intervenção policial na
Cracolândia, em janeiro deste ano, simboliza a lógica cega que rege as
políticas estatais "de negação, silêncio e repressão".
Isabel Harari
Fonte: Carta Maior
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